Vereador de Marialva está sujeito a ter mandato suspenso por ter flagrado médico dormindo enquanto pacientes aguardavam atendimento

 Vereador de Marialva está sujeito a ter mandato suspenso por ter flagrado médico dormindo enquanto pacientes aguardavam atendimento

Na madrugada do dia 11 de novembro de 2021, o vereador Rafael Ferreira de Oliveira, conhecido como Rafael Poly, relatando estar recebendo uma série de denúncias da população sobre a demora no atendimento de pacientes, compareceu ao pronto atendimento local para fiscalizar, pessoalmente, como o serviço público estava sendo realizado, onde se deparou com um casal com duas crianças, sendo que uma delas que já havia recebido atendimento ainda chorava e sentia fortes dores, mas não era atendida pelos médicos de plantão.

Então perguntou aos funcionários presentes sobre a falta de atendimento e comunicou a estes que entraria no local para verificar a situação, acabando por se deparar com um médico dormindo em seu consultório com as mãos segurando a cabeça e os olhos fechados. O vereador bateu na porta o acordando e solicitou a escala dos médicos e perguntou onde eles dormiam, mas o médico negou as informações. Então o vereador foi procurar onde era a ala de descanso dos médicos e encontrou outro médico que supostamente usufruía de um descanso, segundo informações repassadas pelos enfermeiros, enquanto pacientes aguardavam atendimento.

O vereador filmou todo o ocorrido e publicou em suas redes sociais (onde é possível ver o médico realmente dormindo em sua sala) onde se mostrou indignado com a situação e disse que tomaria providências junto ao poder público para apurar esta situação. No  Facebook e Instagram do vereador, ainda não mantidas as postagens que geraram a polêmica.  Após o episódio, o Município de Marialva instaurou sindicância, mas não obtivemos resposta sobre o resultado. Contudo, sabe-se que pouco tempo após o ocorrido, o médico que aparece no vídeo dormindo, , foi desligado do quadro de médicos credenciados do município. A situação teve grande repercussão local e a população aprovou a atitude do vereador. Porém, a atitude desagradou os médicos e servidores que atuam no pronto atendimento, inclusive porque a população passou a exigir mais qualidade no serviço de saúde e rapidez nos atendimentos.

Então, pouco mais de um mês após o ocorrido, o médico que aparece dormindo no vídeo, e o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Marialva – SISMAV, apresentaram denúncia contra o vereador Rafael Poly perante o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Municipal de Marialva, acusando-o de “abuso de suas prerrogativas de vereador” e de “quebra de decoro” ao dirigir-se a unidade de pronto atendimento e, sem as devidas permissões, adentrar nas dependências hospitalares com a finalidade de promover filmagens que foram postadas nas redes sociais do vereador, colocando em risco a vida dos profissionais e atentando contra a saúde pública diante do risco de infecção e disseminação cruzada de vírus. Além disso, segundo os denunciantes, nos vídeos, o vereador Rafael teria afirmado de forma falsa que os médicos de plantão estariam dormindo enquanto havia pacientes aguardando atendimento.

Ainda, o médico que aparece nas filmagens e outros dois médicos que estavam no pronto atendimento naquela madrugada, realizaram um Boletim de Ocorrência na 23ª Delegacia de Polícia Civil de Marialva, alegando que a conduta do vereador Rafael caracterizava os crimes de calúnia e difamação. O Boletim de Ocorrência deu origem ao Termo Circunstanciado nº 0002827-80.2021.8.16.0113 do Juizado Especial de Marialva, no qual o Promotor de Justiça que analisou o caso concluiu que dentre as funções do vereador está a tarefa de fiscalizar o serviço público e os atos praticados pelo Poder Executivo e que, portanto, essa fiscalização realizada pelo vereador Rafael, é possível concluir tratar-se de fato ínsito ao seu dever funcional de vereador, publicizando e levando ao conhecimento da população situação que constatou no exercício da sua função, ocasião em que relatou que pediria a instauração de sindicância em relação ao  poder Público Municipal, estando também amparado na sua imunidade parlamentar, não tendo praticado nenhum ilícito penal, sendo caso de arquivamento dos autos, o que foi acolhido pelo Juízo que homologou o arquivamento do Termo Circunstanciado.

Contudo, no dia 13 de junho de 2023, um ano e sete meses após a fiscalização do vereador Rafael, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara de Marialva, composto pelos vereadores Luciano Dario (Grude), Ronaldo Campana e Marcos Fontes, apresentou o relatório final do processo disciplinar, no qual entendeu restar suficientemente demonstrado que o vereador Rafael agiu em flagrante abuso das prerrogativas constitucionalmente  asseguradas aos parlamentares, atentando contra a dignidade e responsabilidade da função pública e, consequentemente, violando o art. 3°, inciso l do Código de Ética e Decoro Parlamentar que assim diz: “Art. 3°.

Constituem faltas contra a ética parlamentar de todo o Vereador, no seu exercício de mandato: 1- comportar-se dentro ou fora da Câmara, por atos ou palavras, de forma atentatória à dignidade e às responsabilidades da função pública e atuar de forma nociva à imagem do Poder Legislativo em sua atividade política e social;”. Entendeu ainda, que o vereador extrapolou os limites de sua imunidade parlamentar. Assim, emitiu parecer pela procedência da representação, para que fosse aplicada medida disciplinar de suspensão temporária do mandato do vereador Rafael Ferreira de Oliveira por 30 (trinta) dias, por cometer falta contra a ética parlamentar.  Para que o vereador Rafael fosse punido com a suspensão de seu mandato, era necessária a aprovação do relatório em plenário por maioria absoluta, ou seja, metade mais um dos nove vereadores da casa, que neste caso seriam cinco votos.

A votação deveria ocorrer na sessão plenária do dia 19 de junho de 2023, ocasião na qual o advogado do vereador processado, Dr. Leandro Coelho, realizou sustentação oral criticando a concessão da palavra ao advogado do médico denunciante por não ser parte no processo e mencionando estar o processo eivado de nulidades. Defendeu, ainda, que o vereador Rafael apenas agiu no seu dever fiscalizador e deu publicidade aos fatos resguardado pela sua imunidade parlamentar.

O advogado também fez duras críticas ao Conselho de Ética, que estaria fragilizando as prerrogativas dos vereadores e também quanto ao critério utilizado para concluírem que a conduta deveria ser punida de forma tão grave, vez que o vereador nunca havia sido punido anteriormente, de modo que no máximo poderia receber uma advertência. O advogado ainda lançou no ar sobre a possibilidade de estar havendo uma perseguição política ao vereador Rafael, pois, caso sofresse uma suspensão de seu mandato, em um eventual novo processo disciplinar poderia ter seu mandato cassado.  Após a sustentação oral, iniciou-se uma celeuma quando a vereadora Josiane Luiz da Silva solicitou um intervalo na sessão para se reunir com os demais vereadores. Ao retornarem com a sessão, alguns vereadores se manifestaram por retirar de pauta a votação para analisarem melhor o caso, o que motivou vaias de munícipes presentes no local. Também o vereador Rafael não estava de acordo e queria que o relatório fosse votado.

A sessão novamente foi interrompida, com a saída dos vereadores e do advogado do vereador Rafael do plenário. Ao retornarem, o vereador Toninho Raspa pediu a retirada da votação do relatório por sete dias. “Vamos estudar uma medida disciplinar mais branda, pode ser uma advertência”, justificou raspa. O pedido foi aprovado pela maioria do plenário, com voto contrário apenas do relator vereador Marcos Fontes.  Contudo, ao que foi averiguado, foi pautado para esta segunda-feira dia 26 de junho, a votação do mesmo relatório do Conselho de Ética sem qualquer mudança, ou seja, opinando pela suspensão temporária do mandato do vereador Rafael Poly por 30 dias.

Em contato com o vereador Rafael Poly, o mesmo manifestou estar indignado com o ocorrido, pois está sujeito a ter seu mandato suspenso por fazer o que todo vereador deveria fazer, que é fiscalizar os serviços públicos, levar ao conhecimento da população e buscar providências junto ao poder público. Disse também estar revoltado com a atitude do presidente da câmara em colocar em votação o mesmo relatório no dia 26, pois no intervalo da sessão plenária do dia 19 o presidente e outros vereadores insistiram para que fosse retirado de pauta a votação para que o relatório fosse alterado para aplicação de uma mera advertência, não tendo sido mantida a palavra.  Em contato o Dr. Leandro Coelho, advogado responsável pela defesa do vereador Rafael Poly, o mesmo emitiu a seguinte nota: “É triste ver um conselho de ética cujos membros atuam em desfavor de suas próprias prerrogativas de vereadores. Em um momento de tamanha instabilidade institucional na nação, esta seria uma oportunidade dos vereadores de Marialva defenderem suas prerrogativas constitucionais apoiando a atitude do vereador Rafael, que nada mais fez do que exercer com afinco sua função fiscalizatória e se manifestar livremente amparado pela imunidade parlamentar.

Caso o vereador venha a ser punido por seus pares, estes estarão rasgando a Constituição Federal”.  O advogado também confirmou que no intervalo da sessão plenária do dia 19 houve um combinado para alterar o relatório do conselho para colocar em votação a aplicação de uma mera advertência ao vereador Rafael. “De fato, no intervalo da sessão houve uma espécie de acordo de cavalheiros entre o vereador Rafael, o presidente da câmara e outros vereadores que eram contra o parecer do Conselho de Ética, para que na próxima sessão fosse colocado em votação a aplicação de uma mera advertência.

E embora saibamos que o vereador Rafael não tenha cometido qualquer infração ética, aceitar uma mera advertência não lhe traria prejuízos e resolveria todo aquele imbróglio. Inclusive, na própria sessão plenária foi dado publicidade a isto. Até em meu Instagram eu já havia noticiado. Porém, a palavra não foi mantida e pautaram a votação do mesmo relatório sem qualquer alteração. Resta saber como a maioria irá votar”, explicou o advogado.  Apesar de não citar nomes, não conseguimos contato com o médico para ouvi-lo nesta publicação. Colaboração da reportagem do repórter Ronaldo Senes o “Berimbau”.

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